quarta-feira, 25 de janeiro de 2012

Bar dos Literários

Andava sem necessidade pela cidade. Pelo centro dela. Varava a noite alta tropical, os bares todos abertos e entro num.
E eis que me deparo com seis figuras, das quais nunca descrevi.
São seis personalidades desconhecidas verdadeiramente, contudo, mereciam algum sucesso. São literários, que todas as segundas-feiras reúnem-se na mesa 14 do Bar Zon e discutem todas as questões, físicas e metafísicas, do universo. Encontros marcados pela longa duração, vai até o taberneiro, seu Manoel, decretar que, de fato, o bar vai fechar. Marcados também pelo alto teor melancólico, pelas discussões desnecessárias e pelas lágrimas de um ou dois que revivem qualquer romance não-escrito por eles.
Eu apenas observo e não os conheço, como toda a gente desconhece. Portanto, não tenho como dar-lhes nomes, farei, pois, uma apresentação inicial.
Um é romancista contemporâneo, julgo eu, tem as calças desembainhadas, magricela e porta-voz das frases curtas. Sempre quis escrever um livro. Contudo, todas as suas estórias parecem acabar antes de chegar à segunda página.
Outro, um pouco mais escuro que os demais e com a pele mais machucada pelo sol, é um poeta popular. Detém aquela sabedoria popular, fala em quadras até num simples conversar.
Há o mais velho de todos, com uns vinte a mais em relação à média do grupo, que é, que vive há dois séculos atrás do nosso, veste roupas impecavelmente velhas e tem aquele ar romântico, ele quem dá mais melancolia às conversas. Sempre a lembrar dos tempos que eram diferentes dos atuais, apesar de parecer não ter vivido aquele tempo com tanta intensidade. Recita poemas ao léu, com os olhos voltados para o nada e com a expressão de estar vislumbrando o infinito.
O quarto literário, nunca o vi sorrir, tem um ar sério e uma barriga enorme. Cultiva um bigode que já inicia-se a ficar grisalho. É mais policial, teve algum sucesso, quando investigou o sumiço misterioso das taças do último campeão do torneio de futebol da ilha menor. Ele parece sempre saber dos bastidores de toda trama policial. Escreve muito, pouco produz.
Existe um que por pouco também me enganou. Trata-se de um ator jovem, que atua tão bem como escritor, que é, na verdade, um grande charlatão literário.
E há um, que vive na penumbra, num canto quieto e a fumar todos os cigarros do mundo. Acho que nunca ouvi a voz dele.
São os seis literários mais desconhecidos que reconheci terem talento para algo mais que as segundas-feiras no Bar Zon com vinho do Porto, um jogo de sinuca preguiçoso e o seu Manoel dizendo por vinte vezes que o bar fechou.

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