quarta-feira, 23 de maio de 2012

Antenor à esquerda

Antenor era um sujeito tenaz. Todas as suas coisas tinham certa convicção. Muitas delas, faziam algum sentido,  como a cor azul marinho da gravata, a mariscada da Tia Joana e o Wood Allen. Não discutia muito, gostava de dizer do que queria. Seus amigos sempre gostaram da sua companhia.
Tinha apenas uma convicção que causava estranheza. O Antenor tinha peculiaridade, sempre queria ficar no lado esquerdo. Sempre. Não havia um argumento produtivo, contudo...
Escrevia com a mão esquerda. No time da sala, era o ponteiro... esquerdo. Quando cresceu a sua ideologia ficou clara, esquerdista. Sempre ultrapassava pela esquerda, nesse ponto, devo confessar, seguia a norma de trânsito comum no ocidente. Porém, o mais esquisito era ele ter que enfatizar isso, sempre que iam ao cinema, ele já anunciava:
- Eu fico à esquerda!
Todos não levavam tão à sério. Talvez, se ele não falasse, já naturalmente isso aconteceria. Ele ficaria à esquerda.
Certo dia, uma grande cantora internacional visitou a cidade. Ele objetou o seu lugar para acompanhar. Joaquina, uma daquelas jovens loiras estonteantes com tez metade sueca metade russa, uma conhecida, não tão amiga assim. Conhecida, de andar de vez em quando com a mesma turma do Antenor, por ser amiga da Aninha, prima do Guto, amigo do lado esquerdo de Antenor. Joaquina não era tão questionadora. Mas, ao ver que aquela intrigante e convicta afirmação, ficou incomodada.
Comprados os assentos, devidamente do lado esquerdo. Iam lá, além de Antenor e Joaquina, o próprio Guto, a Aninha, Manuela e Otávio, mais outros que não convém lembrar-lhes os nomes. Antes de começar o show e já com as bebidas em mãos, a festa já tinha um ar de festa. Iriam ver uma apresentação internacional!
Num dado momento Joaquina reparou outra vez o Antenor se vangloriando de estar no lado esquerdo da platéia e de como era muito melhor. Intrigada, a loira voltou os olhos para o palco, o mestre de cerimônias agitava o público que enchia o pavilhão de concertos. Continuava a pensar. A pergunta lhe veio, como um dardo diretamente chegando no alvo, olhou novamente para o Antenor:
- Sabes que vamos ficar no canto direito do campo de visão da artista, não é?
Antenor não havia pensado nisso. Joaquina voltou o olhar para o palco, apontou e artista entrou. Começava o show internacional.

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